Análise: Apple pode ficar para trás na concorrência de IA sem melhorias na Siri

Quando a Apple apresentou a versão atualizada da Siri em junho passado, a companhia a descreveu como "o início de uma nova era" para sua assistente digital, que já conta com 13 anos de existência. Durante a apresentação, foi demonstrado como a assistente virtual conseguiria correlacionar informações de e-mails, mensagens de texto e dados de voos em tempo real para responder a perguntas mais elaboradas, como “Quando meu voo vai pousar?” e, em seguida, “Qual o plano para o almoço?”. No entanto, a implementação dessa visão parece estar mais distante do que se previa.

Em 7 de março, a Apple anunciou que estava adiando uma atualização da Siri que permitiria oferecer respostas mais personalizadas, utilizando dados do iPhone do usuário, além de realizar ações em aplicativos em nome da pessoa. Essa postergação trouxe preocupações sobre a possibilidade da Apple ficar para trás na competição por inteligência artificial, gerando inquietação interna na divisão da Siri. Um executivo responsável pelo produto chegou a classificar a situação como “feia” e “embaraçosa”, conforme reportado pela Bloomberg.

A inteligência artificial é vista como a próxima grande transformação em como interagimos com a internet, potencialmente alterando a maneira como as pessoas trabalham, se comunicam e buscam informações no futuro. A Apple foi pioneira na era móvel em 2007 com o lançamento do iPhone, que se tornou o dispositivo de computação mais crucial em nossas vidas. Neste momento, a expectativa é de que a Apple repita esse feito, agora com a inteligência artificial. Entretanto, o tempo avança enquanto concorrentes lançam novos modelos, chips e funcionalidades impulsionadas por IA a uma velocidade superior em relação a outras inovações tecnológicas.

Os desafios não param por aí. Assim como muitos gigantes do setor, a Apple enfrenta a iminente ameaça de tarifas sobre importações da China, onde partes fundamentais da cadeia de suprimentos do iPhone estão localizadas. Adicionalmente, as vendas de iPhones na China caíram 11% em comparação ao ano anterior, de acordo com o CEO Tim Cook, que mencionou isso durante a teleconferência de resultados de janeiro. A receita global do iPhone, que é um aspecto determinante para o valor de mercado da Apple, superior a US$ 3 trilhões, também não atingiu as expectativas do mercado no primeiro trimestre fiscal, embora a receita total tenha subido 4% em relação ao ano anterior. Na tarde de terça-feira (17), as ações da Apple caíram cerca de 12% em relação ao ano.

Apesar dessas complicações, há também um panorama positivo. A vasta base de usuários da Apple e a ubiquidade do iPhone conferem à empresa uma vantagem em meio a tais dificuldades, afirmaram especialistas à CNN. “Em tempos desafiadores, a Apple está bem situada, pois seu negócio principal é um smartphone”, comentou Barton Crockett, um analista sênior na Rosenblatt Securities. “E o smartphone tornou-se, indiscutivelmente, um item de consumo essencial, um dos mais indispensáveis.”

A Apple ainda não fez um comentário oficial sobre a situação, mas já há tempo circulam preocupações sobre a capacidade da Apple em se destacar na área de inteligência artificial, especialmente em relação aos seus dispositivos, como iPhones, Macs e iPads. A primeira série de recursos da Apple Intelligence foi lançada apenas em outubro, deixando a Apple atrás de concorrentes como Google e Samsung, que já haviam integrado mais ferramentas de IA em seus produtos.

Para até o final de 2024, muitos dos recursos da Apple Intelligence, incluindo a geração de emojis personalizados e a utilização do ChatGPT pela Siri, devem estar disponíveis. Contudo, a versão renovada da Siri almeja proporcionar uma mudança significativa na forma como os usuários interagem com seus iPhones, permitindo que questões sejam resolvidas sem que seja necessário alternar entre diversos aplicativos, como por exemplo, buscar uma receita enviada meses atrás ou editar fotos. Essa é uma abordagem que as gigantes também tentam aplicar em seus modelos Android.

Initialmente, a Apple havia anunciado, em junho, que implementaria esses recursos avançados ao longo do ano seguinte, antes da sua conferência de desenvolvedores em junho. A atualização estava prevista para ocorrer em abril, conforme informações da Bloomberg. Entretanto, a porta-voz da empresa, Jacqueline Roy, declarou que “levará mais tempo do que esperávamos para entregar esses recursos”, desejando lançá-los no próximo ano, conforme relatado em um blog de tecnologia em 7 de março.

Enquanto isso, concorrentes como Google e Amazon estão adaptando ainda mais seus assistentes de IA. O Google recente implementou no Gemini a capacidade de personalizar respostas baseadas no histórico de pesquisa do usuário, enquanto a Amazon anunciou a Alexa+, uma nova versão da Alexa que pode lembrar preferências de usuários, como restaurantes ou artistas favoritos.

“As pessoas estão preocupadas, pois a Apple precisa se manter relevante nesse contexto”, alertou Ben Bajarin, CEO e analista principal da Creative Strategies. “O fato de que eles não têm apresentado muitos resultados tangíveis em seus esforços é o que mais inquieta os consumidores.”

Dificuldades como essa são um território inexplorado para a Apple. A companhia, conhecida por seu domínio no mercado, particularmente na China, enfrenta concorrência crescente de marcas tecnológicas locais. Ao longo da última década, a Apple também tem expandido suas divisões de serviços digitais e dispositivos vestíveis para compensar períodos de vendas mais lentas do iPhone. Embora tenha lidado com tarifas durante a administração anterior, a Apple conseguiu evitar algumas das consequências na época.

Entretanto, um atraso como este é algo raro para a empresa. “Não me lembro de um evento semelhante na história da Apple”, disse Gene Munster, gestor da Deepwater Asset Management. “Isso não significa que a cultura da empresa tenha mudado, mas reflete o quanto estão enfrentando uma pressão significativa.”

Apesar de o iPhone permanecer central à estratégia da Apple, Wall Street está sempre de olho no futuro, especialmente em um momento em que os smartphones perderam seu “fator impressionante” e se tornaram mais comuns. Em geral, os consumidores atualizam seus dispositivos quando necessário, não necessariamente por entusiasmo por novos recursos. Em suma, a Apple precisará estabelecer seu lugar como líder na próxima grande mudança após os smartphones, que parece ser a inteligência artificial.

Até o momento, a Apple não provou que pode fazer isso com a Apple Intelligence. Quanto mais tempo levar para que a nova versão da Siri seja lançada, mais longo será o caminho para resolver essa preocupação. Apesar dos contratempos, alguns analistas mantêm uma visão otimista sobre o futuro da Apple. Dan Ives, da Wedbush Securities, escreveu em uma nota que “em 2025, a Apple atingirá novos patamares”. Cook também mencionou que as vendas do iPhone têm sido mais robustas nos mercados onde a Apple Intelligence está disponível.

Há também justificativas plausíveis para o adiamento do lançamento da Siri. Se a nova versão não estivesse funcionando conforme esperado, uma prorrogação poderia evitar problemas. O Google enfrentou críticas no ano passado quando seu recurso AI Overviews fez uma sugestão inusitada sobre pizza. A Meta também teve que retirar perfis gerados por IA de suas plataformas após reações negativas.

A Apple ainda está desenvolvendo uma nova versão mais delgada do iPhone para este ano, conforme relatórios de diferentes fontes de mídia. Isso pode gerar um novo interesse no seu produto mais icônico, especialmente em um momento onde concorrentes estão explorando designs inovadores, como o smartphone em forma de acordeão da Huawei.

No final das contas, o adiamento da Siri não é suscetível a gerar dúvidas sobre a visão e a direção geral da Apple, conforme colocou Crockett. “O caminho que eles estão trilhando é claro; esses recursos irão surgir e melhorar”, apontou. “Assim, a funcionalidade futura do iPhone será superior à do passado… Existem novidades promissoras à frente para se aguardar.”

Referência: CNN

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